Ontem (quarta-feira, 31) ocorreu a Aula Inaugural: “Time Brasil rumo a Tóquio: impactos e desafios na preparação dos atletas Olímpicos”, organizado pela Escola de Ciências da Saúde e da Vida da PUCRS. Luis Henrique Rolim, Membro do Comitê Brasileiro Pierre de Coubertin (CBPC) e Professor da Escola, ao lado da também Professora da instituição, Fernanda Faggiani, foram os mediadores do evento realizado na sede do CBPC, na PUCRS. A Coordenadora de Psicologia do Comitê Olímpico do Brasil (COB), Aline Wolf, o Coordenador de Fisioterapia do COB, Ronaldo Aguiar, e a Atleta Olímpica da Canoagem, Ana Sátila, foram os convidados para falar sobre como tem sido a preparação para os Jogos Olímpicos de Tóquio 2020, frustrações e problemas causados pela Pandemia, bem como as expectativas para o megaevento que ocorrerá em julho deste ano.
Faggiani, também psicóloga esportiva, ressaltou após a ocasião a importância do trabalho conjunto entre todas as áreas envolvidas para melhorar as condições de treinamento e competições dos atletas: “Destaco a relevância da interdisciplinaridade tão bem explanada e alinhada entre os convidados, mostrando que a coesão é fundamental para buscar o alto nível no esporte. […] Sabemos da importância do cuidado com a saúde mental de todos aqueles envolvidos no contexto do esporte de alto rendimento”.
Sobre a oportunidade de ouvir o COB antes dos Jogos, bem como entender as aflições e as histórias da Atleta Olímpica brasileira, Rolim refletiu: “É sempre um privilégio estar diante de profissionais que lideram processos tão importantes na preparação de atletas Olímpicos, como a fisioterapia e psicologia. Fica evidente os resultados positivos de um trabalho integrado e multidisciplinar para proporcionar ao atleta as condições ideais para conquistar os seus objetivos. Também, como referi durante a Aula Inaugural, considero o Atleta Olímpico uma ‘entidade’ e ter a oportunidade de interagir com a Ana, a cem dias dos Jogos, realmente foi único. Muitas vezes se espera somente do atleta a medalha, o resultado, o pódio e acabamos esquecendo do ser humano que também está vivendo esse terrível momento de pandemia e, assim como todos, sofre com perdas, mudanças e incertezas. A Ana em especial, mostrou-se uma atleta muito focada nos seus objetivos e com uma força mental incrível. Fiquei com a impressão de que os desafios enfrentados por ela e, quem sabe todos os atletas brasileiros, poderão ser um combustível a mais na hora de competir. Estou na torcida desde já por todos”.

O evento foi divido em 3 rounds com diferentes temáticas. O primeiro foi “Legado Rio 2016 e as expectativas para o novo Ciclo Olímpico”. Nesse sentido, Wolf abriu a conversa lembrando que a Rio 2016 foi um período muito importante para a consolidação da Psicologia do Esporte Olímpico brasileiro: “Nós tivemos um trabalho muito massivo e importante no Rio 2016 […]. A psicologia pode se consolidar como uma área dentro do Comitê Olímpico. Das 19 medalhas que nós conquistamos, 16 tiveram a participação do psicólogo, o que mostra que a área também é fundamental para o desenvolvimento do atleta. Esse legado é muito precioso”. Nesta direção, Aguiar, complementando a colega, enfatizou a ideia da multidisciplinaridade à serviço dos atletas durante os Jogos de 2016: “Ter uma equipe diversificada ajuda demais o atleta com seus objetivos e preparos tanto físico como psicológico. Durante a Pandemia o grupo de psicólogos foi e está sendo o mais requisitado, era de se esperar pois é uma situação nova para todos nós e nossa cabeça se confunde”.
Sobre este tema e a partir da ótica dos convidados, Rolim explica: “As falas dos convidados foram extremamente relevantes. A impressão que o público em geral possui com relação aos Jogos Rio 2016 é negativa, muito pautada nos lamentáveis episódios envolvendo autoridades e, consequentemente, as dificuldades em administrar/ativar as estruturas deixadas pelo evento. Esse legado tangível é bastante criticado e com razão. Agora, o que ouvimos dos convidados na Aula Inaugural revela outros aspectos que ainda precisam ser avaliados como legado do Rio 2016. Foi citado, por exemplo, um avanço na integração e coordenação dos diferentes departamentos a partir também das novas estruturas deixadas pelos Jogos, tais como os centros de treinamento e laboratórios. A experiência profissional adquirida pode ser um dos grandes legados do Rio 2016 que ainda necessitam investigação. Esse é o chamado legado intangível que agora, passados um Ciclo Olímpico, já podemos buscar respostas. No Grupo de Pesquisa em Estudos Olímpicos da PUCRS nós já estamos desenvolvendo uma linha de pesquisa voltada à analisar esses aspectos intangíveis a partir de diferentes atores no Rio 2016. O entendimento dos aspectos intangíveis é importantíssimo para que possamos aprofundar o debate sobre o impacto do evento para esporte e sociedade brasileira; não esconder os aspectos negativos, mas sim pontuar outros elementos relevantes, como a aquisição de novos processos e conhecimentos citados durante a conversa sobre o legado dos Jogos Rio 2016”.

Já a Atleta Olímpica desenvolveu sobre como foi o começo de dificuldades na sua carreira: “Eu era uma das únicas mulheres que faziam parte da delegação que foi à Londres, era mais nova da delegação com 16 anos e nunca havia competido fora do Brasil. Não consegui render nada devido à minha pressão mental”. Sátila, até então, não tinha um acompanhamento psicológico e isso influenciou para um baixo rendimento nos Jogos do Rio, segundo ela.
A “Pandemia” foi a temática do 2º round. Sátila aproveitou o momento para contar o quanto foi difícil, e que ainda está sendo, lidar com a situação das incertezas que a Pandemia do Covid-19 trouxe: “Foram quatro meses direto treinando em casa, sem sair. Minha mãe fazia as compras no mercado e nós ficamos completamente isoladas, com medo. Como atleta, tentei me cuidar ao máximo, a parte física eu até consegui me preservar em casa, mas o psicológico foi bem afetado pelas incertezas […] Quando os Jogos foram cancelados foi devastador, na época tirei duas semanas para pensar e refletir, eu estava realmente animada e preparada para competir, e saber que não aconteceria e ficar na incerteza se seriam realizados ou não foi horrível”. Aguiar complementa como foi alcançado o suporte aos atletas neste momento de frustração, a fim de manter ativas as relações de trabalho: “Nos reinventamos para dar assistência fisioterapêutica de maneira online, mas era completamente diferente do nosso atendimento anterior. Porém, ao mesmo tempo queríamos muito dar esse suporte, e nós conseguimos prosseguir e melhorar. E, ainda, conversamos com todos os profissionais envolvidos com os atletas, sobre a importância de dar uma parada nos treinamentos para não causar sobrecarga na periodização deles”.
No último round, foi falado sobre o “Cenário Tóquio 2020/2021”, das expectativas e de como é trabalhar nessa parte final de preparação. A atleta se mostrou muito animada para competir e representar o Brasil mais uma vez nas Olimpíadas, e frisa o apoio do Comitê Olímpico Brasileiro na preparação. Sátila aconselhou a meditação para “aliviar um pouco os momentos de ansiedade”. Ressaltou ainda que mesmo sem o apoio presencial da torcida brasileira, espera que os Jogos sejam inesquecíveis e que está “ansiosa e preparada para representar o país”. Aguiar e Wolf contam que seus trabalhos nesta parte final buscam dar o suporte necessário aos atletas para que eles possam acessar facilmente sua força de vontade após todas as dificuldades superadas no último ano. Além de destacarem um possível diferencial dos atletas brasileiros: “Eu tenho em mente, que nosso atleta é sensacional! Ele tem resiliência, é criativo, é do povo brasileiro. E isso vai fazer diferença nos Jogos nos trazendo resultados maravilhosos, pela capacidade que o atleta brasileiro tem de se adaptar”, afirmou Aguiar.